Ana Filipa Ferreira (Fibrose Quística)

21-03-2011 16:38

·         Quando e como lhe diagnosticaram a fibrose quística?

A FIBROSE QUISTICA foi-me diagnosticada aos 5 anos de idade. Através do teste do suor.

Os sintomas iniciais eram: tosse, constipações frequentes e diarreia. Após varias idas ao medico, apenas uma me pediu para fazer exames. Desconfiando inicialmente de tuberculose, após fazer o teste, deu negativo. Depois a medica enviou-me logo para o Hospital Maria Pia no porto para fazer o teste do suor que deu positivo. E desde logo fiquei a ser seguida nesse hospital.

 

·         Qual foi a primeira coisa em que pensou quando lho comunicaram?

      Se referem-se á descoberta da doença:

      Como era muito pequena, não compreendia o que se passava. Mas desde logo senti que era “diferente”, mas numa perspectiva de especial. Não diferente, de inferior.

      Se referem-se ao comunicar do transplante:

      Pensei que era a única solução que tinha para viver, e desde o primeiro segundo que aceitei e nunca me passou pela cabeça recusar a única forma que tinha de viver.

 

·         Como reagiu a sua família quando soube?

      Se referem-se á descoberta da doença:

      Foi um choque enorme e inicial, sendo a esperança media de vida na altura de 7/8 anos e claro que foi complicado. Mas desde logo adaptaram a vida de todos, meus pais e irmão, ás minhas possibilidades e limitações para que me sentisse bem. Pois o objectivo deles sempre foi e ainda é: o meu bem estar.

      Se referem-se ao comunicar do transplante:

      Ficaram assustados relativamente as dimensões e á gravidade da cirurgia. E claro que tomaram consciência que estava numa situação limite da doença e era a única hipótese possível de eu viver, e só tinham de aproveitar, tal como eu fiz.

 

·         Após o transplante, quando acordou, qual foi o seu primeiro sentimento relativamente aos seus dois novos pulmões, e à pessoa que lhos terá doado?

      Achei tudo muito rápido e fácil. Foi mesmo “já está?”.

      E quando respirei, foi como se tivesse acabado de nascer. Foi algo que não consigo explicar na totalidade, é uma alegria tão grande, um sentimento de vitória inexplicável.

      Relativamente aos órgãos, só tenho agradecer que alguém tenha tido a bondade de doar os seus órgãos, e claro que tenha-me salvado a vida. Mas não penso muito a nível de identidade do dador. Não é algo que me vá fazer sentir mais ou menos feliz. Só tenho de pensar que me os doaram e tenho o dever de os cuidar muito bem , tal e qual como se tivesse nascido com eles.

 

·         Sentiu que tinha algo que lhe era estranho, dentro de si?

      Claro que o facto de ter dois pulmões que não são verdadeiramente meus, é algo estranho. Mas estão bem em mim, estão a “funcionar” direitinho. E são a minha vida actual. É só esse pensamento que tenho de ter.

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  Qual foi a pessoa, que durante todo o processo, mais a marcou?

      De família, foi sem duvida os meus pais e o meu irmão.

      Ate porque quando acordei da anestesia apenas reconhecia e me lembrava do meu irmão Marco. E lembro-me de todos os momentos que passei no hospital como na minha casa em Lisboa, de alegria, risos e brincadeiras com a situação que estava a decorrer na minha vida.

      De amigos, é o meu melhor amigo Nelson. Foi alguém que nos cuidados intensivos me deu uma força enorme e de quem tenho muito orgulho. Fez-me sempre sentir bem, demonstrando a força que eu tenho, e “garantindo-me” sempre que tudo iria correr bem. E que me prova todos os dias que “há males que vêem por bem”, foi com toda a doença , que com o transplante me fez conhece-lo e me provou que afinal a amizade existe, e é verdadeira.

 

·         Conseguiu voltar rapidamente ao seu ritmo do dia-a-dia?

      Na totalidade de inicio não. Pois tenho uma cicatriz bastante grande e ainda tenho um arame que me prende o externo (que foi cortado para a colocação dos órgãos), e existem cuidados que tenho de ter. Mas após 5 meses da cirurgia voltei a escola e a fazer educação física (que já não praticava á 6 anos). E agora trabalho, mas tenho sempre que ter cuidado com esforços. Mas já corro, jogo futebol e tenho uma vida praticamente normal.

 

·         Notou alguma diferença a nível psicológico, quando saiu do hospital?

                        Depois da cirurgia muita coisa se altera, nomeadamente a “nossa cabeça”. A concentração é mais complicada, fiquei um pouco mais esquecida. Há quem diga que sou distraída, mas não é bem isso. Como não me consigo concentrar, não tomo tanta atenção ás coisas por muito que me esforce para tal.

                        E depois são os sonhos, após o transplante ficamos a sonhar bastante com tudo o que nos aconteceu. Deve ser uma espécie de “marca forte” na nossa vida. É uma experiencia muito forte, psicológica, física e sentimentalmente muito forte. E é preciso uma gestão de emoções muito forte para que não desanime, nem desista. O transplante exige bastante de nós, doentes.

                        Mas também é a melhor experiencia/sensação de sempre. E se tivesse de repetir por alguma razão, faria tudo igual.